Vermelho, Branco & Sangue Azul

Vermelho, Branco & Sangue Azul é uma adição interessante ao cinema queer que, às vezes, precisa de uma diversão como essa

Escrito por Casey McQuiston, Vermelho, Branco & Sangue Azul é um romance além da imaginação. É tão fantasioso que perpetua clichês mesmo em sua interpretação mais simples. A história, que conta o amor entre o filho da presidente dos Estados Unidos e um príncipe britânico, se divide entre passagens políticas e momentos inusitados.

E, embora siga por esses caminhos, Vermelho, Branco & Sangue Azul busca sempre manter a simplicidade de tudo o que toca. Em uma adaptação, isso não seria diferente. O filme, produzido pela Prime Video, é tão simples quanto o livro que o inspirou — e este é o seu maior acerto.

Vermelho, Branco & Sangue Azul
Imagem: Prime Video

Mudanças

Quem já leu o livro deve ter percebido que o cenário principal são as eleições americanas, aquela que sempre chama a atenção do mundo pela disputa histórica entre democratas e republicanos. Na obra de McQuiston isso fica evidente o tempo todo, inclusive ocupando uma posição primordial no papel de Alex.

Já no longa, por sua vez, o contexto político é reduzido ao essencial, descartando todo o imenso e complexo aparato de bastidores da corrida eleitoral que Elle Claremont, mãe do protagonista,  está concorrendo. Resta à personagem, interpretada pela lendária Uma Thurman (Pulp Fiction, 1994, e Kill Bill – Volume 1, 2003) exercer apoio em cenas específicas — e ela o faz muito bem.

Tais mudanças no texto dão mais espaço para a narrativa tentar, a todo instante, se referir a diferentes momentos do livro. Isso, claro, faz parte da ideia central de conquistar leitores que anseiam por essas situações. Um exemplo é a cena do peru, que mesmo sendo bem enxuta e pouco interessante como no material de origem, ainda estava lá, fazendo referência à obra.

Vermelho, Branco & Sangue Azul
Imagem: Prime Video

A fórmula

Mantendo o raciocínio em relação às mudanças, é preciso falar da forma como as diferentes linguagens, a do cinema e a do livro, conseguem se relacionar. Vermelho, Branco & Sangue Azul segue uma fórmula em seus dois formatos, mas, na adaptação, a fórmula da comédia romântica, sem dúvida, é a que mais deu certo.

Os exageros, clichês e outros elementos que empurram o longa para o campo acessível só funcionaram por causa dela. É um efeito em paralelo — sobre romance real — com filmes como O Diário da Princesa, de 2001. Vermelho, Branco & Sangue Azul surge na mesma linha, porém, com questões sociais/políticas mais realistas.

Vermelho, Branco & Sangue Azul
Imagem: Reprodução/Prime Video

O texto

Muito do interesse em ver como acontece o namoro entre Henry (Nicholas Galitzine) e Alex (Taylor Perez) se deve ao impacto inimaginável que este teria no mundo real. Assim, somos constantemente lembrados de como uma relação homoafetiva, mesmo na ficção, está longe dos níveis aceitáveis pela sociedade, mesmo que tudo dê certo no final.

É como Alex evoca em seu discurso, em um dos pontos altos do filme: “Eu amo Sua Alteza Real, o príncipe Henry George Edward James Hanover-Stuart-Fox. Espero que todos tenhamos a oportunidade de tornar público nossos relacionamentos em nossos próprios termos”. Embora no livro essa passagem seja ainda mais emocionante, o roteiro consegue captar muito bem a imagem dramática que, pela aproximação do final, foi necessária para servir de combustão na resolução dos fatos.

A partir daí, notamos que a indagação sobre a relação entre os protagonistas ultrapassando os limites e prejudicando os meios tradicionais da política dos dois países, aos olhos das autoridades, se baseia nos sentimentos que o romance alimenta, de forma progressiva, entre as diferentes partes. Não é como se fosse apenas um caso pronto para ser desmentido e negado; quando sua privacidade é invadida, o casal é obrigado a não deixar que tudo seja apenas uma invenção conjunta para prejudicá-los: é mais uma prova de que precisam lutar duas vezes mais para viver sua paixão.

Vermelho, Branco & Sangue Azul
Imagem: Reprodução/Prime Video

Conclusão

E não pense que essa paixão não é aproveitada pela posição dos personagens, muito pelo contrário. Henry e Alex estão definitivamente em chamas em seu relacionamento. Os momentos de amor e beijo, mesmo carregados da intensidade dos atores, não se tornam o foco por bobeira — são feitos para demonstrar que eles estão no seu melhor. Além disso, na cena em que Henry decide desafiar a ordem do avô e ir para a sacada do palácio ao lado de Alex, a narrativa atinge um momento de intensidade emocional palpável.

O ato de Henry de não ceder à pressão para se esconder, a determinação de Alex e a visão impactante de uma multidão unida, erguendo bandeiras do orgulho em gesto poderoso de apoio, simbolizam a mais verdadeira força do amor, encapsulando os temas centrais da história e tocando profundamente os corações de espectadores. Nesse ponto, a obra não só celebra o romance entre Henry e Alex, como também repercute na luta por igualdade e inclusão que a comunidade LGBTQ+ enfrenta, tornando-se um marco emocionalmente ressonante na trama.

Vermelho, Branco & Sangue Azul é, como toda comédia romântica, um filme com altos e baixos, algo permanente do gênero. Mesmo os pontos mais negativos da produção, como a montagem e edição, acabam se somando no contexto da intenção do diretor estreante, Matthew Lopéz, de fazer dessa história um clássico remodelado. É uma adição interessante ao cinema queer que, às vezes, precisa de uma diversão como essa.

Matheus José

Graduando em Letras. Crítico, colunista e redator nos sites Jornal 140, VIUU, Suco de Mangá. Editor e supervisor de textos. Já passou por publicações da BoysLove Hub e China Word Notes.