A grande indústria do entretenimento sul-coreana tem testado a receptividade do público aos gêneros queer?

Com o crescimento do gênero Boys Love nos últimos anos e a percepção da importância da representatividade de modo geral, surge o seguinte questionamento: A grande indústria do entretenimento sul-coreana tem testado a receptividade do público aos gêneros queer? A Coreia do Sul se tornou um dos dos países que vem furando bolhas sociais e estereótipos por meio de sua indústria de entretenimento, a fim de inclusão dentro dos seus cenários de entretenimento, como reality’s, grupos de k-pop, e k-dramas. Vamos usar como introdução a nossa conversa o k-drama A Time Called You, que se tornou um mega assunto, não só da comunidade BL, mas também para os dorameiros em geral.

A presença de histórias LGBTQIA+ em enredos de k-dramas não é algo recente, no entanto, sempre foi usado de forma discreta como no estilo friends to lovers não assumidos, bromance ou aproveitando da receita ultrapassada hollywoodiana: sem um final feliz, para alívio cômico ou sem esclarecer a relação dos personagens. Vale introduzir também a informação que a Coreia do Sul não possui quase nenhuma lei vigente que proteja e acolha a comunidade LGBTQIA+. 

Quais portas “A Time Called You” abriu?

Into your Time
Imagem: Reprodução / Netflix

O diretor da série Kim Jin-won comentou em entrevista para a Joy News24, que se preocupou e trabalhou muito nas cenas para entregar a química necessária nas telas, e para isso, sugerindo que que Ahn Hyo-seop indicasse com quem ele gostaria de contracenar, e foi assim que Rowoon, ex-integrante do grupo de k-pop SF9 entrou para o elenco de forma muito assertiva. Após a aparição no episódio 8, o drama ficou no Top 10 globais Netflix por uma semana, o que abriu espaço para a discussão sobre mais inclusão de forma positiva e natural, com finais felizes e realistas.

Outra pauta levantada pelos fãs, é a presença de atores e atrizes da grande indústria em produções queer. Muitos olharam para o momento como um teste: até que ponto está a receptividade do público para conteúdos com diversidade? O mercado do entretenimento sul-coreano é construído para atrair estrangeiros e fortalecer a economia do país, porém, ao contrário do que se imagina, a opinião que realmente é válida é a dos próprios coreanos, que têm grande influência nas decisões da indústria.

É por isso que mesmo diante dessa expansão mundial, muitas histórias BL são produzidas sem introduzir o romance de forma explícita, usando o bromance ou, para os que que se atrevem, de forma camuflada, com pouco ou nenhum desenvolvimento claro.

Os desafios na industria do entretenimento sul-coreana

Imagem: Reprodução / TVn

Usarei como exemplo o ator e ex-integrante do grupo INFINITE, Hoya, em Reply 1997 (2012). No drama ele interpreta Joon-Hee, um jovem gay apaixonado por Yoon Jae. Fora das telas, Hoya sofreu muita discriminação e especulações desnecessárias sobre sua sexualidade, inclusive dentro da própria indústria e entre outros artistas. O que era para ser mais um clichê adolescente acabou se transformando em uma situação lamentável e constrangedora.


No Brasil, ficamos felizes e animados com o que nos foi apresentado em tela. Mas será que o fato de sermos o 3º país que, de acordo com os dados de 2021, mais consumiu produções sul-coreanas ajuda na introdução e popularização de mais conteúdos de diversidade e inclusão ou ainda é preciso esperar a aprovação dos verdadeiros donos da indústria? Apesar do aumento de representatividade LGBTQIA+ em diferentes formas de entretenimento, persistirão o preconceito e a homofobia?

K-dramas já usavam histórias LGBTQIA+

Imagem: SBS

A Time Called You não é o primeiro que usa de forma passageira casais homoafetivos em seu enredo. É possível encontrar com muita facilidade dramas que usou elementos de forma discreta ao ponto de muitos nem se dar conta sobre o significado destas aparições. No entanto, este se destacou por introduzir de forma explícita e com muita química a relação dos personagens, mesmo que de forma rápida e trágica, além de escolher atores que estão em ascensão dentro do mercado de atuação.

Vincenzo (2021), usou um personagem gay em um momento para alívio cômico e Secret Garden (2010), que ao contrário do outro não usou como comédia, ao invés disso, apresentou um personagem gay com naturalidade sem que a sexualidade fosse um problema.

Reconhecendo a história da representação LGBTQIA+ em k-dramas

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Imagem: KBS2


É importante também dar visibilidade aos dramas que já foram produzidos. Poucos notaram ou pouco se falou que Rowoon já interpretou antes um personagem bissexual em O Rei de Porcelana (2021). No enredo, a princesa ocupa o lugar do irmão gêmeo falecido e começa a receber aulas com o professor Jung Ji-woon (Rowoon) e em meio a toda a trama ao redor do, agora príncipe, surge um romance entre aluno e mediador.


A parte interessante é que apesar de ser uma mulher, aos olhos de todos é um homem, e Ji-woon não vê nenhum problema nutrir seus sentimentos e encarar isso com naturalidade. O segredo só é revelado nos últimos episódios. Apesar disso, é possível encontrar comentários de pessoas que deixaram de assistir por acharem isso ‘estranho’. Como indicação, temos Love With Flaws (2019), com um casal secundário homoafetivo bem introduzido, Itaewon Class (2020) que tem como uma das personagens principais uma mulher trans, e o clássico Coffee Prince (2007), que também aborda a bissexualidade.

industria do entretenimento sul-coreana
Imagem: TVing

Além disso, é fundamental fortalecer ainda mais o pequeno mercado independente de produções boys love, que em pouco tempo já vem conquistando prêmios, ganhando público e reconhecimento, não apenas internacionalmente, mas também dentro da própria Coreia. Este movimento representa um passo significativo em direção à inclusão e à diversidade na indústria de entretenimento sul-coreana, mostrando que histórias autênticas tem o poder de tocar corações e abrir mentes. Com cada novo drama, como “A Time Called You“, a Coreia do Sul trilha um caminho rumo a um futuro mais inclusivo e acolhedor para todos os seus públicos.

Ycla Araujo

Hi! Meu nome é Ycla e tenho 25 anos. Sou graduada em jornalismo e levo a fotografia como hobby. Amo literatura, doramas e o meu recorde é de 128.675 minutos ouvidos no Spotify.